sábado, 7 de fevereiro de 2009

Papo (quase) em dia.

Passado tempo, tanto tempo, cá estou.
Lá se foram eleições pra prefeito, enchentes em Santa Catarina, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro (...), deslizamentos, desabrigados, mortes, eleições pra presidente dos Estados Unidos, Natal, férias, férias coletivas, desemprego, crise (...). Não, a crise, pelo visto, ainda não se foi.

Nessas férias li um singelo livro de Jaime Lerner, Acupuntura Urbana. Simplesmente lindo! Lindo perceber o amor e o orgulho de um arquiteto e urbanista pela sua cidade, Curitiba. Chega a emocionar. Emociona o fato de saber das pequenas histórias contadas pelo próprio arquiteto, ex-prefeito de Curitiba e ex-governador do Paraná. Todas contadas com o orgulho da superação de todos os obstáculos, pequenos e grandes, por quais passou a administração de Curitiba. Todas contadas com amor, orgulho e, principalmente, respeito à população curitibana e ao meio ambiente. Um pequeno livro com uma grande moral. São de gestores com esse sentimento de luta, amor e respeito que nossas cidades precisam. Que Jaime Lerner seja um exemplo pra todos nós, principalmente para os gestores e políticos municipais.

Eu amo a minha pequena cidade, sempre amei. É natural termos um carinho especial por nossa cidade natal, apesar dos problemas urbanos que ela apresente. A minha cidade há tempo passa por sérios problemas urbanos relacionados ao desemprego. Não é de agora que o município está em crise nesse setor. O processo é histórico, uma história da qual eu, particularmente, me orgulho muito, mas que infelizmente não está passando por um momento feliz.

A história é longa, mas vale citar. Teve início com a construção da estrada de ferro, o conseqüente transporte de madeira, abertura de madeireiras, e, sobretudo, abertura de uma grande indústria moveleira: a Móveis Cimo. A história dessa indústria é linda, mas ao mesmo tempo infeliz: foi a maior indústria moveleira da América Latina no período de 1930 a 1970, mobiliou os primeiros cinemas do Brasil e as faculdades federais. Infelizmente essa indústria faliu na década de 80, deixando centenas de trabalhadores desempregados e causando uma enorme crise na cidade naquela época.

A partir de então, os trabalhadores desempregados, com grandes conhecimentos na área moveleira, começaram a fundar pequenas fábricas de móveis... e surgiram diversas! Assim, a base da economia municipal era, e continua sendo, quase que unicamente a indústria moveleira, sobretudo a de exportação; a qual emprega(va) grande parte da população. Tudo corria bem, até que o dólar despencou e gradativamente a crise se agravou. Um processo de anos, que hoje evidencia o auge da gravidade do problema com centenas de pessoas desempregadas, desamparadas, desmotivadas (...).

É lastimável ver minha cidade assim.

Não sou filiada a partido político nenhum e, em geral, acho a política nojenta, devido ao fato de ser conduzida de maneira errada pela maioria dos “representantes do povo” nas administrações públicas em nosso país.

Essas eleições foram novamente marcadas pelo predomínio do interesse pessoal de muitos dos canditados a prefeitos e vereadores em diversos locais, quando deveriam ser unicamente marcadas pelo interesse na oportunidade de buscar e aplicar soluções para a qualidade das cidades, em todos os aspectos. Mas, vergonhosamente, o que se viu (e, em alguns lugares, ainda se vê) são brigas partidárias, por conta dos tais interesses pessoais.

É por esses e outros motivos, pela perda de foco nos interesses públicos por parte dos políticos, e, principalmente, pela falta de amor, orgulho e respeito às cidades, ao seu meio ambiente e às suas pessoas, eu gostaria que todos os políticos tivessem acesso a esse livro. Que Jaime Lerner sirva de inspiração...


Até onde você gosta da sua cidade? Geralmente você gosta da sua cidade porque nasceu nela. Mas o que você acha da sua cidade? Você a conhece, sente-se parte dela? Ou as pessoas que projetam a tragédia já o influenciaram a tal ponto que você tem certeza de que não há mais solução, que a sua cidade é a que tem a pior infraestrutura, a mais violenta, a mais injusta? Ainda mais se for uma cidade grande, onde são grandes os problemas e fica mais fácil justificar essa frustração pela escala.

Mas a escala nada tem a ver com a inviabilidade de uma proposta. Nem a falta de recursos. O mais importante é a visão correta, e uma competente equação de co-responsabilidade. O que é necessário é um cenário, ou uma idéia, um desenho desejável. E todos – ou a grande maioria – vão ajudar a fazer. Aí, nesse exato momento de realização, a auto-estima da população faz a cidade avançar.



É isso que falta, era disso que eu tava falando.... ;)

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Agora sim.

Ponto fora de plano. Como já dizia Oscar Niemeyer: arquitetura não é o mais importante. O importante são os amigos. As pessoas. E suas atitudes diversas, estranhas e intensionais. Aqui o foco não vai ser falar de arquitetura, afinal... tempo atrás criei um blog restrito ao assunto arquitetônico, e adivinha? Nada escrevi. Porque falar só de arquitetura, que graça tem? Que importância tem, se não relacioná-la com nada e ninguém? O foco são as pessoas, essas sim... há muito o que falar, questionar, refletir.
Mas eu não falar de arquitetura, impossível. É o meu sonho que está quase se realizando! Tá, vá lá... tá tão quase quase se realizando que já cheguei ao ponto de questionar se é sonho ou não. (No momento tá mais pra não). Mas quem já viveu isso afirma ser uma fase "normal", pela qual passam todos os arquitetos quando acadêmicos. Hoje mesmo uma colega recém-formada veio me dizer que vai abandonar a profissão. Eu disse: "O quê? Guria, você está ficando louca?" Não, não, ela só quer ter horário pra entrar e pra sair do escritório, e ter garantido o salário no final do mês. Loucura não? É a esse tipo de ponto fora de plano que eu me referia.
Agora vejo tudo diferente de quando estava só no plano. Pra falar a verdade, não tive muita opção de escolha não...tudo conspirou pra uma só opção. Muito antes de entrar pra facu, cheguei a pensar que trabalho de arquiteto fosse mais gostoso que comer chocolate e mais tranquilizante que uma sessão de massagem oriental: passar as tardes desenhando, trabalhar se divertindo. Que engano! Hoje me pergunto se meus colegas um dia também pensaram assim. (Pensaram?).
Logo percebi que as coisas não éram tão simples como imaginei, quando comecei a trabalhar em um escritório de arquitetura como desenhista. Na verdade, as coisas não éram nada simples. Trabalhar com clientes então, nem se fala... Imagina que haviam clientes que achavam que escritório de arquitetura éra como o mercado da esquina: é só pedir o produto no balcão que ele já vem pronto. E mais, se você não gostou do produto (pronto, impresso e aprovado na prefeitura) pode trocar por outro que não paga mais nada por isso, nem pelas outras 10 pranchas A1 que terão de ser plotadas novamente, nem pelas mais de 40 horas de trabalho. E se a obra já começou, não há problema nenhum em mudar as paredes de lugar, esticar aqui e ali, aumentar a área, que problema tem? O terreno é meu, e eu não vou deixar 4 metros de afastamento. E se contratei o arquiteto pra projetar a casa dos meus sonhos com 600m², mas decidi que não vou construir, eu não preciso pagar o projeto. Essas são algumas das pérolas. Tá aí outro ponto que não estava no plano.
[Mas não sejamos pessimistas. Eu, apesar dos desabafos, sou otimista sempre! Acredito que somos nós arquitetos que tenhamos que mudar esse mundo, e, pra nossa sobrevivência, mudar o pensamento desses clientes! Mas pra isso acho que deveria ter uma disciplina envolvendo a parte psicologica da coisa, porque que é difícil é.]
Continuando a história...
Depois de imaginar a coisa errada e ver que não éra bem assim, entrei pra faculdade (eeee). Pelo menos parte dos pontos que não estavam nos planos já haviam sido descobertos. Entretanto, fui sendo iludida pela vontade de mudar o mundo de alguns professores, que vinham com o discurso de que podemos mudar o mundo através da arquitetura sim! Podemos melhorar a qualidade de vida se pensarmos na habitação saudável, com qualidade, acessível para a população de baixa renda. Podemos promover relações sociais se planejarmos espaços urbanos aconchegantes e interessantes, que atraiam as pessoas e promovam integração entre as classes, e estimulem a caminhada e os passeios de bicicleta em substituição do carro. Podemos preservar a memória com a recuperação, restauração, reutilização e revalorização de antigas edificações de relevância para a história de nossas cidades. Podemos provocar boas sensações nas pessoas propondo espaços de contemplação, mesmo que sejam para contemplar a própria arquitetura, desde que essa promova um sentimento bom. Podemos recuperar áreas degradadas e preservar o meio ambiente com o planejamento de parques, bosques, trilhas; e escolha de materiais para os edifícios que causem o menor impacto ambiental possível, preocupação com a orientação solar, utilização da água das chuvas, preocupação com o entorno e etc, etc, etc.
Sinceramente, tudo isso me encantou de um jeito que fiquei por muito tempo sem conseguir pensar em mais nada. Na minha cabeça a arquitetura éra muito boa, boa demais! Perfeita! Éra exatamente isso que eu queria, fazer coisas boas para as pessoas e para o meio ambiente e ainda ganhar por isso. Mas não demorou até outros pontos fora de planos aparecerem. Na verdade eles não apareceram, sempre estiveram aí... em todos os lugares, eu é que não tinha os percebido dessa forma. O primeiro tapa veio quando outro professor falou que arquitetura é coisa pra rico. Nada contra, isso sempre soubemos, mas o mais difícil foi engolir o ""... na verdade até hoje eu não engoli.
Pensando bem, de todo errado ele não está, principalmente se partirmos do princípio que o que é (leia-se está) mais importante que tudo hoje, inclusive mais importante que as pessoas e que a arquitetura, é o dinheiro... grana, money, dimdim. Não importa se a casa é preta, branca, brega, extravagante, se ela tiver mais águas no telhado que a casa do vizinho tá valendo; essa é a forma de demonstrar o poder de hoje em dia (kkkk). E pra quê se preocupar com a questão do aquecimento global ou com a crise energética?! Hoje em dia temos condicionador de ar split e vidros especiais com películas para impedir o desconforto térmico dos ambientes, com tudo isso não precisamos nem mais nos preocupar com o norte do terreno, tem grana sobrando pra comprar o que precisar, e o planeta que se dane. Também não precisamos de parques, praças e ciclovias coisa nenhuma: os shoppings centers são o paraíso, não, são melhor que o paraíso porque têm condicionador de ar, proteção contra intempéries, estacionamento interno e comida artificial. Hoje em dia também não precisamos mais conversar, nem nos abraçar, mal temos tempo pra isso, além de que os relacionamentos ficam por conta do orkut, melhor do que qualquer praça ou parque, o único que consegue reunir 865 amigos num só lugar ao mesmo tempo.
E é por esses e outros pontos que estão (estavam) fora do plano que decidi vir aqui trocar uma idéia com vocês, quem sabe a gente se entende, ou vira amigo no orkut.